Sunday, July 25, 2010

Longe de mim

Esqueci as rimas
Não sei de cor as cores do teu cabelo,
Anseio quente, inquieto, o tom da tua voz
Pressinto o dia em que o teu calor se fará meu, no meu peito
Vejo-te ao sol, com paz
Em casa, sentada no chão de madeira, fazendo parte de mim
O teu cheiro nos livros e nos roupeiros
A tua luz livrando o ruim das ruínas
Como se um sopro varresse todas as poeiras do tempo
Um sonho real em que durmo nos teus braços

Longe do tempo, longe de mim.

Monday, July 12, 2010

Era dia de olhar para dentro

Era dia de olhar para dentro. Os detalhes do pão que se amassava sobre a mesa eram visíveis até ao pormenor microscópico. No castelo, o Rei aborrecia-se a ver o pobre bobo que se esforçava para repetir sempre a mesma coisa com aquela expressão de doloroso divertimento. Uma criada fazia amor com um guarda, nas catacumbas onde se armazena a farinha. As ratazanas fugiam assustadas para o esgoto que se debruçava em cascata sobre o rio. O rio corria em fino deleite em direcção ao dorso verde que o conduzia em braços até ao mar. Certa princesa lia sob a sombra das laranjeiras floridas que a guardavam de toda a perversidade do mundo. Os cavaleiros ensaiavam batalhas ao som das trovas épicas que entoavam a par de um bandolim já bebido.
Os cães cheiravam-se. A panela negra já fervia na fogueira com o almoço dos homens.
A pureza rosada da terra desvanecia-se nas faces rosadas de uma jovem. Espartilho cintado até aos seios que apertados se escondiam prestes a explodir.

À noite o Rei mata-se. O seu corpo repousa enforcado sobre o seu tapete vermelho que se enrola até quase lhe tocar nos pés.
Era dia de olhar para dentro. O dentro era fora.

How Many